quinta-feira, 11 de junho de 2015

ASAS DA CRIAÇÃO




Rebentaram do casulo
Feito uma larva
Colorida entre as folhas, camuflada
Que fazem saltar às flores
Beleza discreta voa com leveza
Quase invisível procurando alimento e abrigo

Voo mais alto
De polo a polo, costa a costa
Solitário e veloz de olhar astuto
À espreita pela presa
Repousa sobre as copas das árvores
Para esconder-se no ninho nas montanhas

Correndo até a beira do abismo
Carregando sua asa
Saltando, conduzido pelo vento
Sentindo-o bater ao rosto
Liberto como a ave
Para aterrizar em praia de areia firme

Conhecendo todas as terras como um turista
Cortando as nuvens
Deixando seu gélido rastro
Por sobre os oceanos
O mundo se transforma em alguns segundos
Muitos povos de várias línguas

Transportado pela explosão do foguete
Vendo a Terra azul de cabeça para baixo
Observando-a como o Criador a sua criação
Flutuante sem gravidade
Uma vida que ainda é um sonho distante
Morar no limite do infinito

Deste infinito que transporta substâncias
Vem sem destino para lugar nenhum
Até onde possa se chocar
Numa bola de fogo de destruição
Transformar-se em vida
Como larvas surgindo do seu casulo!


Wagner Pires
in, Roteiros de Uma rotina

segunda-feira, 1 de junho de 2015

CIDADE




As luzes piscam e a cidade sempre em movimento. Caminham, passos, alguns apressados, circulam carros. Outros em duas rodas: motorizados e motivados - motivados a pedalar e exercitar. O farol se abre pessoas de um lado para o outro, de um lado para outro. Multidão, se esbarram, se empurram, mas nem se tocam, não se olham: atarefados, preocupados, desinteressados. O rapaz ainda tenta trocar um olhar que não é correspondido, ainda tenta mais uma vez olhando para trás, olha para a bunda. "Rapaz, olha o desrespeito, não confunda". Ela segue seu trajeto sem ao menos se incomodar. Ambulantes vendem seus pertences. Camelôs, engraxates e jornaleiros são os únicos imóveis vendo tudo se movimentar. Lá e cá o pregador, segurando a Bíblia na mão, grita palavras de fé para que alguém as ouça, procurando o arrependido, faminto, desesperado. Nem os gritos conseguem acordar o morador das calçadas, pouco aquecido com o velho cobertor, alguns dormem entorpecidos, perturbado, seu fiel cão acomodado ao seu lado. Cenário perturbador, imensa dor. O barulho é intenso, tenso, irritante, assustador. Assustado com as sirenes o cidadão procura em movimentos. A viatura passa devagar, observando, à procura da crise, do crime, ronda, ninguém está seguro. Nem mesmo do próprio policial corrupto, violento, stressado, mal remunerado, julgado e condenado pela organização criminal. Os vidros blindados, fachadas fechadas: o calor é frio e insensível, o cidadão se torna um invisível. Noites frias iluminadas por neon são aquecidas pelo álcool, movimentada e agitada madrugada, não para, música em alto som: carros, bares, baladas. Frisson, ninguém dorme, nem ao menos o cansado trabalhador. A adrenalina consome: banalidade, futilidade, sexo, drogas, tudo é diversão. Quando acordam, realidade, depressão: trabalho, política, economia. Veem as notícias nos jornais, telejornais, internet em seus celulares: metrô lotado, ônibus apertado, mulheres se protegendo do doente masturbador. Até o inocente se sente culpado na pressão nesta louca cidade. As crianças seguem a rotina para a educação que não tem refletido na cultura social. Culpam a corrupção. Onde está o corruptor? Ganância pelo poder que leva à soberba, só ostentam riqueza. Consumismo sem pensarem nas consequências quando tiverem que pagar as faturas, outras falcatruas. E, em busca de solução, correm para o trabalho na cidade que continua circulando em movimentos apressados sem se preocupar com o calendário. As luzes vão piscando nesta cidade que vai se movimentando, uns correndo, outros caminhando, sem se incomodarem em olhar para todos os lados!


“O que o homem ganha com todo o seu trabalho em que tanto se esforça debaixo do Sol? Gerações vêm, e gerações vão, mas a terra permanece para sempre. O Sol se levante e o Sol se põe, e depressa volta ao lugar de onde se levanta.”

Eclesiastes 1:3-5


Wagner Pires
in, Roteiros de Uma Rotina